Municípios de São Paulo podem perder R$ 1,05 bilhão em repasses do FPM com reforma do IR

As arrecadações estaduais podem ter ainda queda de R$ 105 milhões.

Os municípios do estado de São Paulo podem perder cerca de R$ 1,05 bilhão em repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) com a nova proposta de reforma do Imposto de Renda, de acordo com um estudo da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite). As arrecadações estaduais podem ter ainda queda de R$ 105 milhões.

O PL 2.337/2021, enviado pelo governo federal, prevê, entre outras medidas, uma forte redução do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), o que compromete estados e municípios, que têm os impostos sobre renda como importante fonte de receita.

A análise da Federação aponta que ao reduzir as alíquotas dos tributos cobrados das empresas, estados e municípios terão perdas bilionárias e verão os recursos dos fundos de participação caírem em R$ 16,5 bilhões.  

A proposta de reforma da tributação sobre a renda vai implicar em uma redução média de R$ 319 milhões nos repasses para o Fundo de Participação dos Estados (FPE) e de R$ 293 milhões no Fundo de Participação dos Municípios (FPM). A queda de receita é significativa, visto que uma média de 80% dos municípios tem o fundo como sua principal arrecadação. 

Para Sara Felix, especialista em direito tributário e em administração pública e vice-presidente da Associação dos Auditores Fiscais de Minas Gerais (AFFEMG), o Governo Federal está repassando a conta da reforma para estados e municípios, buscando equilibrar sua receita com ajustes em suas contribuições, mecanismo que os entes subnacionais não dispõem.
 
“Ao mesmo tempo em que o próprio Governo Federal exige dos estados e municípios rigor e equilíbrio fiscal, ele impõe um modelo de reforma repassando uma conta para esses entes, retirando receita. São esses entes subnacionais que estão mais próximos do cidadão e são eles que são os mais cobrados por serviços de qualidade, sem dispor de nenhum outro mecanismo para recuperar essa receita, que é tão importante para prestação desse serviço”, afirmou. 
 
Com a diminuição de arrecadação, Felix acredita que as unidades federativas devem reduzir serviços voltados à população a fim de balancear as perdas. 

Setores da economia convergem sobre necessidade de reforma tributária ampla

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Queda de investimentos e do emprego 

A reforma do IR propõe alterações no Imposto de Renda de pessoas físicas e das empresas, e taxação de lucros e dividendos com alíquota de 20%.  Para compensar as desonerações concedidas a algumas modalidades de investimentos financeiros e a pessoas físicas, o PL aumenta a tributação total sobre os investimentos produtivos. A nova calibragem das alíquotas do imposto de renda resulta em tributação total sobre os investimentos produtivos de 39,6%, ao invés dos atuais 34%. 
 
Segundo a advogada tributarista sócia do Pereira do Vale Advogados, Rafaela Calçada da Cruz, se a reforma for aprovada na forma em que se encontra na Câmara, além do prejuízo de arrecadação dos entes federados, também pode gerar impacto na queda de investimentos e consequentemente no emprego.
 
“A reforma vai na contramão dos investimentos produtivos, que é o que mais impulsiona a economia. Só pra se ter uma ideia, mesmo com o PL ainda aguardando votação, as empresas estão simulando como seria o cenário econômico fiscal em diversas situações, o que gera insegurança e incertezas”, afirmou.

Reforma tributária ampla

A Reforma Tributária ampla (PEC 110/2019) é vista como uma solução na busca da unificação de tributos entre União, estados e municípios, e simplificação do sistema de cobrança. A complexidade e burocracia do atual sistema tributário do Brasil contribui para elevação dos custos de fabricação dos produtos brasileiros, cria insegurança jurídica, diminui a competitividade do País no mercado internacional e promove a fuga de investimentos.
 
“A PEC 110, entre as diversas melhorias propostas, busca proporcionar não cumulatividade plena do imposto, ressarcimento ágil dos créditos acumulados para o contribuinte, redução da regressividade do sistema, fim da guerra fiscal, que tem sido imensamente predatória para os caixas dos estados e municípios, e ainda fortalecer a administração tributária no caminho de uma relação respeitosa e construtiva entre o fisco para os contribuintes”, destacou a vice-presidente da AFFEMG, Sara Felix. Para ela, se aprovada, a proposta deve reduzir o Custo-Brasil e reaquecer a economia.

Fonte: Brasil 61

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Estado de São Paulo aumenta valor de ICMS a partir desta sexta- feira

Medida vai causar aumento no preço de mercadorias que antes eram beneficiadas com redução de alíquota ou base de cálculo

O estado que mais arrecada o ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) no país irá mudar a partir desta sexta-feira sua sistemática de tributação e aumentar o valor do imposto. São Paulo irá reajustar uma gama extensa de produtos para cima, com verduras, legumes, frutas, leite longa vida, eletrônicos, têxteis, gás, óleo diesel, TV por assinatura, couro e calçados, entre outros.

Até então eles eram isentos ou pagavam alíquota reduzida, mas agora passam a recolher o ICMS. O aumento do imposto pode representar um impacto de até 14% no preço de vários itens e serviços, segundo a Fiesp, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. A mudança, contestada em tribunas superiores, deve pressionar o setor produtivo no maior estado do Brasil, que arrecadou R$134,3 bilhões do imposto nos primeiros onze meses de 2020, e influenciar o cálculo em outros estados.

A alteração ocorreu por meio de uma Lei sancionada em novembro pelo governador João Dória (PSDB) e que buscou o reequilíbrio das contas públicas. Entre alterações na máquina pública e em temas como o IPVA, os deputados aprovaram o poder do estado a reduzir benefícios fiscais e obrigam que todos os benefícios fiscais dados por São Paulo passem pelo crivo da Assembleia Legislativa.

O governo também passa a considerar que todos os bens e serviços com alíquota inferior a 18% sejam equiparados a benefício fiscal – o que na prática faz com que benefícios possam ser concedidos, reduzidos ou revogados a qualquer tempo e de acordo com o interesse do Poder Executivo. “Em outras palavras, se por algum motivo o Poder Executivo entender que determinado setor na economia deve contribuir para o aumento na arrecadação, a redução ou revogação pode ocorrer por ato do Poder Executivo, sem precisar da aprovação do Poder Legislativo”, explicou a advogada tributarista sócia do Pereira de Vale Advogados, Rafaela Calçada da Cruz.

À publicação das leis foram emendados outros decretos que regulamentaram a carga tributária de itens como o querosene de aviação, além de estender ou encerrar uma série de benefícios fiscais. “O principal efeito dessas medidas é o aumento no preço das mercadorias que antes eram beneficiadas com redução de alíquota ou base de cálculo, mas que saem do zero a 18% num curto espaço de tempo”, disse o professor da FGV Rio e sócio da área tributária do Costa Tavares Paes, Richard Edward Dotoli. “Esse tipo de ‘manobra brusca’ não se faz sem o prejuízo ao consumidor. Aliás, um erro na política fiscal tributária de muitos anos não se corrige com violência, mas sim com diálogo e escalonamento.”

O governo do estado diz que não haverá aumento tributário – mas sim “em uma autorização legislativa para reduzir benefícios fiscais”. No entanto, não foram poucos os setores que criticaram a proposta. Produtores de flores manifestaram contrariedade ao aumento (o estado produz 70% da oferta nacional do bem). A Apas (Associação Paulista de Supermercados) disse que ainda aguarda que o governo edite normas que impeçam o aumento de preços em produtos de primeira necessidade vendidos em seus associados.

“Aumentar a carga tributária para os produtos de primeira necessidade comercializados pelos supermercados, principalmente nesse momento de crise pelo qual o mundo está passando, afetará substancialmente todas as famílias paulistas”, escreveu a associação em nota na última terça-feira (12), “principalmente os mais humildes, pois quanto menor a renda familiar, maior a dificuldade de pôr a comida na mesa”. O setor de distribuição de automóveis teme 40 mil demissões imediatamente após a entrada em vigor da Lei.

O impacto, apontou o tributarista lgor Mauler Santiago, é um forte aumento de carga tributária – independente do que diga o governo. “A regra não se sustenta. A Constituição qualifica como normal – dispensando aprovação do Confaz – toda alíquota interna superior à interestadual”, disse o sócio fundador do Mauler Advogados, se referindo ao artigo 155 da carta magna.

 A medida de São Paulo pode gerar um efeito dominó nas tributações do ICMS. “Até o momento, o estado de São Paulo é o único com um programa de ajuste tributário vigente com este elevado nível de austeridade, mas a continuidade da crise da Covid-19 pode obrigar os demais estados a adotarem medidas similares para equilibrar as contas públicas”, disse o advogado tributarista do Ogawa, Lazzerotti e Baraldi Advogados, Paulo Octtávio Calháo. O setor privado deve batalhar contra o aumento.

Ao menos uma ação já se encontra no Supremo Tribunal Federal (STF) para decisão: a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 6656, protocolada na semana passada (6/1) pela Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados). O setor não foi incluído na isenção tributária junto de unidades públicas e Santas Casas – e poderia sofrer, de acordo a Anahp, um aumento de custos com o retorno da tributação sobre equipamentos e insumos utilizados na cadeira de saúde para hospitais privados.

Segundo a Anahp, um convênio de ICMS firmado sobre o tema e que inclui todos os hospitais fica desrespeitado pela nova tributação. “Os convênios ratificados pelo Estado de São Paulo não previam a delimitação do regime de isenção estabelecido apenas às operações destinadas a hospitais públicos federais, estaduais ou municipais, Santas Casas ou entidades beneficentes e assistenciais hospitalares, como dispõe os atos normativos impugnados”, escreveu a associação, na sua petição inicial. O relator é o Ministro Nunes Marques.

Camita Mazzer de Aquino, que é  coordenadora da área tributária do WZ Advogados, aponta que a judicialização pode seguir por interpretações do CTN. “O artigo 178 do Código Tributário Nacional diz que a isenção só pode ser revogada ou modificada por lei, no caso, seria modificada por ato do poder Executivo, o que é indiscutível”, explicou. “Ainda, quando falamos de incentivos fiscais de ICMS que foram autorizados no âmbito do Confaz, mediante negociação com outros Estados, a mudança da alíquota ou base de cálculo em um dos Estados tem impacto nos demais que recebem produtos originados de São Paulo.”

Já Gustavo de Godoy Lefone, que é sócio coordenador do departamento de Direito Tributário do BNZ Advogados, ressalta que a questão a ser discutida nos tribunais é de seletividade, uma vez que a Constituição trata de maneira diferente o ICMS de outros impostos federais. “Diferente do IPI, a Constituição Federal usa o termo ‘pode’ para o ICMS e não ‘deve’. Neste ponto, alguns magistrados e doutrinadores entendem que ‘pode ser seletivo’ não se equipara a ‘deve ser seletivo’ e, por este motivo, o Estado pode optar ou não pela aplicação do princípio da seletividade.”

Por este motivo, indicou Gustavo, que o grande ponto a ser interpretado pelo Judiciário girará em torno da discussão se as alíquotas menores que 18% têm caráter seletivo ou se tratam de benefício econômico.

Fonte: LexLatin